10/10/2009

Os três pilares de espiritualidade de P.Places...Cont.

3. A vida de comunidade: da observância regulamentar à mística de um cenáculo de vida consagrada ou seja: da vida comum à comunhão de vida:

Depois de 18 meses de experiência feliz de vida em comum, Poulalrt des Places encontra as primeiras dificuldades. sérias. Foi a crise de 1704. Sente-se só para um projecto que cresce e o ultrapassa. È trabalho demais para ele. E esse trabalho absorvente esvazia-o por dentro: perde a alegria de rezar e de rezar com os outros ”Eu deixei o mundo para procurar a Deus , para renunciar á vaidade e para salvar a minha alma e sinto-me tão longe dessa entrega”! Foi uma crise seguida de um retiro em que lança a sua obra com novas bases Para continuar a formação dos seminaristas pobres era necessária uma organização mais forte que a que ele tinha improvisado. Na “casa de Caridade” da rua des Cordiers ele estava só no meio de jovens cujo número aumentava continuamente. Este ministério exigia, para prosseguir solidamente, estruturas, homens, lugares, regulamentos, enfim uma organização mais sólida. . O seu esforço agora é de providenciar a tudo deixando de ser ele o único ponto de referência Sem pensar nele, mas apenas em Deus. Ele compreende que a solução está na constituição de uma equipa de formadores : Assim nascerá a comunidade dos Messieurs du Saint Esprit: a comunidade improvisada vai tornar-se uma comunidade estruturada, em tudo semelhante a uma comunidade religiosa. È preciso preparar para as Ordens, a começar por ele.. Ele vai pedir o diaconado e o sacerdócio logo que isso seja possível.
Entretanto cria para já uma rede de colaboradores : pede a três para colaborarem com ele:: Jacques Yacinte Garnier ( que será o seu sucessor), Jean Le Roy e MIchel Vincent Le Barbier, que será o primeiro padre espiritano. Toma também o”pobre P. Carris”, como membro da comunidade que será o ecónomo, durante muitos anos e que permanecerá na congregação como a memória viva da pobreza espiritana.. A este grupo juntaram-se alguns leigos: o alfaiate, o cozinheiro, o porteiro. Foi esta equipa de formadores que se tornará a primeira célula da Congregação do Espírito Santo. Era uma comunidade ao serviço da formação dos estudantes pobres para o ministério das paróquias rurais e dos lugares para os quais dificilmente se encontravam obreiros. Esta é a comunidade das origens que só viria a ser reconhecida oficialmente com o P. Bouic, pois o decreto de 1666 proibia a fundação de comunidades religiosas sem cartas patentes do Governo
Para levar a cabo este projecto era necessária uma casa maior que a casa do Gros Chapelet. Poullart des Palces lançou-se à procura de uma casa mais funcional e encontrou-a ali perto na Rua Nova de Saint Etienne, a dez minutos do colégio de Luís o Grande, com mais espaço e um belo jardim. Ali se instalou com 50 jovens nos princípios de Outubro 1705 e aí permanecerá até 1709, data em que a comunidade se deslocará para a Rua des Postes, hoje Rua Lhomond. ´Para esta nova comunidade, já mais consistente, era preciso criar estruturas de governo, normas que regulassem a vida comum e que seriam codificados nos chamados “Regulamentos Gerais e Particulares”,, adaptadas às novas condições de vida da comunidade. Foi o próprio Cláudio que redigiu estes Regulamentos, de que temos o manuscrita com sucessivas correcções
Quando lemos os 263 artigos dos ”Regulamentos Gerais e Particulares” que Poullart des Places nos deixou, ficamos com a impressão de termos diante de nós um código de observância mais jurídica e formal que inspiradora e carismática. Efectivamente temos normas para os objectivos da comunidade, a admissão dos candidatos, , a vida dos estudantes. os deveres e as obrigações dos estudantes, os programas escolares, as cerimónias litúrgicas e a catequese, as refeições, os recreios, os comportamentos, o silêncio, a modéstia e a obediência, os professores ou explicadores, os cargos: regulamentário, bibliotecário, sacristão, leitor, ecónomo, despenseiro, encarregado das luzes, roupeiro, enfermeiro, encarregado da limpeza, chefe de canto, refeitoreiro, serventes de mesa, lavadores da louça, porteiro, alfaiate, cozinheiro, encarregado dos quartos de banho e por aí adiante. Todos nos lembramos do nosso tempo de seminário ou postulantado onde todos estes cargos tinham toda a expressão.. Por vezes os Regulamentos entram em demasiados detalhes, o que se deve ao facto de os alunos, vindos do meio rural, chegarem aos Seminário sem as normas mais comuns de delicadeza e de convívio fraterno.
No entanto, o mais curioso é que se todos estes Regulamentos se desdobram em pormenores e prescrições não é tanto por causa dessas observâncias como para fazerem da comunidade uma escola de serviços mútuos, de fraternidade e comunhão , onde reinasse um só coração e uma só alma.. Todos estes serviços estão voltados para a fraternidade e comunhão fraterna. Não é por acaso que a divisa “Um só coração e uma só alma” se tornou a credencial dos Espiritanos. Na verdade a comunidade de Poulalrt des Pllaces era mais um espírito que uma estrutura. .A comunidade viveu sem existência legal mais de trinta anos, sem se saber bem se era um seminário ou uma comunidade religiosa. Servia para um e outra. E quando em 1734, com Bouic, ela assumiu uma estrutura legal, esta consistia apenas num corpo de directores requeridos pela lei civil, para que pudesse ter personalidades jurídica. Os directores não faziam votos de religião, mas apenas um contrato. em que se comprometiam a observar os estatutos, de resto muito simples. . Como diz Henri Koren, o vigor desta comunidade não provinha da sua organização mas do seu carisma. O que eles tinham em comum era a concepção do sacerdócio. Ser padre para eles significava uma disponibilidade evangélica a toda a prova, na docilidade ao Espírito Santo para o serviço dos mais pobres e abandonados, acompanhada de uma mística de pobreza. Para eles viver a concepção do sacerdócio bastava para assumirem a vida religiosa na sua radicalidade e os seus compromissos apostólicos não precisavam de qualquer promessa. O que os motivava não era o quadro legal, mas a fidelidade ao Espírito Santo.
A comunidade de Poullart des Places era antes de mais nada uma comunidade de serviços e relações fraternas. Conhecemos em pormenor a rede de serviços que os membros partilhavam uns com os outros. Os Regulamentos falam de 18 cargos ou serviços fraternos. Todas as funções eram exercidas pelos membros da comunidade, tanto os que exigiam especialização. como o cozinheiro, o ecónomo, o alfaiate. como aqueles que se podiam improvisar, como o refeitoreiro, o encarregado da limpeza, .o das lâmpadas e portas, o sacristão, o bibliotecário, o regulamentário, etc. O serviço fraterno é uma das expressões mais significativas da comunhão fraterna. As responsabilidades inclusive as responsabilidades da direcção eram fraternalmente distribuídas.
Era Comunidade que hoje chamaríamos mista ou de missão partilhada Efectivamente dela faziam parte padres , clérigos e leigos, onde o cozinheiro e o alfaiate, leigos faziam parte integrante da comunidade. Os doentes gozavam de uma atenção especial e a norma é que “deviam ser servidos como se fossem o próprio Cristo”
Mas era também uma comunidade de fé e oração. A consagração ao Espírito Santo que caracterizava a comunidade era recordada ao longo do dia pela invocação do Espírito Santo antes de qualquer actividade escolar. Todos os dias se rezava o Ofício do Espírito Santo A. A docilidade a esse espírito era a sua marca de origem.
Comunidade que amava ternamente Maria , concebida sem pecado, ainda antes da proclamação do Dogma da Imaculada Conceição, sob cuja tutela todos os membros eram consagrados ao Espírito Santo.”Sempre que sairmos de casa para algum lado, reunir-nos-emos todos na capela para nos encomendarmos à Santíssima Virgem””Os estudantes terão também uma singular devoção à Santíssima Virgem, sob cuja protecção foram consagrados ao Espírito Santo”
Comunidade de vivência eucarística e liturgia esmerada que ritmava todos os dias da vida dos estudantes. A devoção à Santíssimo Eucaristia prolongava-se pelas frequentes visitas ao Santíssimo durante o dia .“Eu passava tempos consideráveis diante do Santíssimo Sacramento: nisso consistiam aos meus melhores e mais frequentes entretenimentos”.””Experimentava visivelmente ( as bênçãos de Deus) na santa ansiedade que sentia ao aproximar-me do Santíssimo Sacramento do altar”
Comunidade de formação escolar de qualidade. O concílio de Trento tinha criado os seminários para a formação dos aspirantes ao sacerdócio. E programa que propõe para essa formação era exigente. Poullart des Places insere o programa académico dos estudantes na fidelidade a essa exigência. Os estudos incluíam três anos de Filosofia, compreendendo as ciências novas, a Matemática e a nova Física de Newton,, depois cinco anos de estudos teológicos e finalmente, se necessário um mestrado de dois anos em Direito Canónico e Sagrada Escritura. A pastoral dos mais pobres e abandonados merecia todo o esmero desta preparação de nível universitário. Nem hoje os programas de formação dos seminaristas são mais exigentes.
Comunidade apostólica. Desta comunidade nasceu a geração de ouro dos Espiritanos, que foi sem dúvida a dos missionários da América do Norte, no tempo das lutas entre a França e a Inglaterra pela posse destas colónias.

Humanamente falando, o seminário devia desaparecer com o seu fundador. O seu principal colaborador foi nomeado bispo e um outro vai sê-lo pouco depois. O seu sucessor morreu poucos meses depois de assumir o cargo. Apesar disso,, nós vemos o seminário progredir e crescer . Ele terá mesmo um longo período de estabilidade e de consolidação com o P. Bouic, que será o seu superior durante 40 anos, conseguindo dar-lhe uma estrutura jurídica e fazer aprovar as primeiras Constituições Ao P. Carris, não lhe será permitido passar para os Monfortinos e seria o suporte económico do Instituto durante todos esses anos..
Penso que o grande apelo deste ano jubilar é o de recuperarmos a inspiração e o espírito do fundador: a docilidade ao Espírito Santo, a mística da pobreza apostólica e uma comunhão de vida tão aberta ao Espírito que rompa os espaços da nossa tenda e nos abra para os novos modelos de vida comunitária ao serviço da missão.

P. Torres Neiva

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